segunda-feira, maio 23, 2005

A GÉNESE DO CORPO


Corpos em busca de um sentido.
foto: alexandre simas dias

Sasha Waltz traz-nos com Körper uma construção coreográfica onde apresenta, mais do que uma análise, um questionamento sobre o corpo, a nossa relação introspectiva, por vezes patológica, o confronto com o outro, a pesquisa invasiva da ciência e a descoberta sociológica do espaço.
O espectáculo inicia-se debaixo de um ambiente soturno criado pela escassa iluminação sobre um cenário escuro e a música sincopada de Hans Peter Kuhn. No centro do palco ergue-se uma parede alta e na diagonal. Os balarinos vão entrando em cena de costas rentes à parede numa postura desconfiada e suspeita.

Nesta estrutura central detaca-se uma janela ou aquário encrustado onde surgem corpos nus emparedados a passarem uns sobre os outros, que em movimentos suaves ocupam toda área em sucessivos quadros de deslumbrante harmonia humana.

O nu feminino é um ponto marcante de todo o discurso coreográfico que desenvolve uma sequência de quadros cuja temática narrativa perpassa a natureza do corpo. A forma lúdica como os "diferentes" cenários se articulam com os movimentos e a circulação dos bailarinos consegue momentos fortes que prendem a atenção do público. Não só pelo insólito de algumas personagens, mas também pela música que em conjunto com o jogo de luzes suscita a curiosidade pelo que virá a seguir.


Körper, de Sasha Waltz, Centro Cultural de Belém, 19 de Maio 2005
foto: alexandre simas dias

A parede que até então ocupava o centro do palco cai e transforma-se numa rampa onde a luz reflectida acrescenta um elemento de claridade. Do ponto de vista da interacção entre bailarinos o movimento passa agora a envolver todo o grupo numa acção coesa e sincronizada.

Por diversas vezes, os bailarinos aproximam-se da boca do palco e debitam discursos de nexo insólito. Numa das vezes, fazem-no em português. Ela chama-se Cláudia de Serpa Soares. A bailarina, natural de Lisboa, estudou no Conservatório e Escola de Dança da capital. Entre 1993 e 1995 esteve no National Centre for Modern Dance em Angers, e depois trabalhou com Iztok Kovac, Rowan Thorpe, e Jens Altheimer. Depois de ser bailarina convidada em Dialoge de Sasha Waltz, em 1999, desde então que trabalha com a coreógrafa de Körper.


Cláudia de Serpa Soares, natural de Lisboa, trabalha com Sasha desde 1999.
foto: alexandre simas dias

Sasha Waltz toma como ponto de partida a conexão entre a arquitectura e o corpo, e parte assim da descoberta da construção corpórea do ser humano para abordar questões contemporâneas como a manipulação genética.

Na materialização deste tema, chega a atingir momentos de quase comicidade misturada com sentimentos confrangedores, quando faz a contraposição da confusão entre a nomeação das diversas parte do corpo, apresentando depois, em momentos de teatro-dança, o preço de órgãos, transplantes e operações cosméticas.


O corpo e a tecnologia como extensões da mente.
foto: alexandre simas dias

Esta babel de compreensão nominativa e fragmentária do corpo cremos revelar uma criatividade de expressividade arbitrária, sintomática de um pathos, que de algum modo reflecte o trabalho coreográfico desenvolvido em conjunto com os bailarinos, de nacionalidades que vão de Israel à Austrália, ou do Canadá à Lituânia, passando por Espanha e uma presença portuguesa.

segunda-feira, maio 16, 2005

A GUERRA DO GOSTO - contra o junk-wine

Mondovino no King




Jonathan Nossiter: o realizador.

O que encontramos em Mondovino é a distância que vai da tranquila tradição europeia, focalizada em França e Itália, e a gananciosa aliança entre aristocratas decrépitos, também franceses e italianos, com a cultura junk-wine norte-americana.

É o contraponto entre o terroir do gosto, o microclima do sol e da terra em serena harmonia com a cadência humana do tempo, e a projecção global de uma visão do mundo que se afirma detentora arbitrária de uma sabedoria escassa de ponderação.

quinta-feira, maio 12, 2005


Oil on canvas
34 5/8 x 22 1/2 in. (88 x 57 cm.)
Stedelijk Museum, Amsterdam

Malevich, Kasimir: An Englishman in Moscow

quinta-feira, maio 05, 2005

Sou um guardador de rebanhos

Sou um guardador de rebanhos.
O rebanho é os meus pensamentos
E os meus pensamentos são todos sensações.
Penso com os olhos e com os ouvidos
E com as mãos e os pés
E com o nariz e a boca.
Pensar uma flor é vê-la e cheirá-la
E comer um fruto é saber-lhe o sentido.

Por isso quando num dia de calor
Me sinto triste de gozá-lo tanto.
E me deito ao comprido na erva,
E fecho os olhos quentes,

Sinto todo o meu corpo deitado na realidade,
Sei a verdade e sou feliz.

alberto caeiro

This page is powered by Blogger. Isn't yours?